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Drum Kits & Percussion Explorations: Cage, Xenákis, Reich, Max Roach, Milford Graves, Glenn Kotche, Dan Weiss e etc



Entre a passagem do século 19 para o século 20 – momento em que a música erudita passa a romper, definitivamente, com os ecos passadistas do romantismo europeu – trabalhos com focos em explorar a percussão de forma central e concertante são raros, praticamente inexistentes. Quer dizer: a percussão estava fadada, ainda, a ter um papel de mero e tímido acompanhamento nas primeiras peças modernas, sem mencionar que o conjunto de instrumentos e complementos de percussão inseridos no ambiente erudito era muito limitado.  Um fator importante que tiraria a percussão deste status de limitação,  foi a prática das pesquisas etnomusicológicas – com Bela Bartótk sendo o principal precursor, diga-se de passagem – pelas quais muitos dos primeiros músicos modernistas passaram a trazer elementos rítmicos da música folclórica e popular e do próprio jazz, ainda em suas primeiras formas rítmicas, para transvertê-los em inovações e combinações eruditas inéditas. O compositor russo Igor Stravinsky, por exemplo, ao compor suas inovadoras peças para balé, começa a exacerbar o uso da percussão como um fator rítmico e timbrístico importante dentro da sua inédita exuberância orquestral, vide peças como Petroushka (1911), The Rite of Spring (1913), L’Histoire du Soldat (1918) e Les Noces (1923). Outro compositor que daria maior importância para a percussão seria o jovem americano George Antheil, vide a obra Ballet Mécanique (1923) – escrita para o filme cubista-dadaísta de mesmo nome – com os surpreendentes clusters percussivos de seis pianos ao mesmo tempo (!), marimbas e percussão erudita afins. O alemão Paul Hindemith em Kammermusik No. 3 (1925) também segue na mesma linha de dar ênfase numa instrumentação com múltiplos instrumentos de percussão recheando o seu molho. Mas a percussão só atingiria um caráter experimental central com a pioneira peça Ionisation (1931) do francês Edgard Varèse, escrita para 13 percussionistas e piano – inclusive com o uso de componentes do drum kit já bem próximos da configuração de uma bateria jazzística. 

A partir da década de 1930, vários compositores dariam ênfase para peças com foco em explorar novas possibilidades percussivas: o compositor cubano José Ardévol (pioneiro em inserir kits da percussão afro-cubana nos formatos eruditos) e os compositores americanos John Becker, William Russell, Henry Cowell e John Cage seriam alguns dos principais a mostrar trabalhos pioneiros nesta década. No caso do jovem iconoclasta John Cage, um dos grandes experimentalistas musicais do século XX, ele inicia suas abordagens experimentais justamente com explorações no âmbito da percussão a partir das peças First Construction in Metal (1939) e Imaginary Landscape (peça também de 1939 que, além da percussão, também é precursora no uso de toca-discos). Mostrando uma curiosa predileção por kits de percussão do Oriente médio, da Ásia e da percussão chinesa – lembrando que ele era fascinado pela filosofia do I Ching, pela qual adentraria aos conceitos de música aleatória –, Cage também levou bem adiante seu interesse por instrumentos de percussão adaptados ou inventados – inclusive, sendo ele mesmo um dos precursores das técnicas estendidas de piano preparado. Entre os anos de 1938 e 1939, Cage empreendeu um esforço considerável para construir uma coleção de instrumentos de percussão em sua estadia como compositor convidado e professor assistente na Cornish School em Seattle, Washington – vide foto acima de uma lista de próprio punho de Cage, que circula nos fóruns, sites e fanpages dedicados ao compositor. Além dos instrumentos tradicionais americanos, orientais e asiáticos, Cage fez apelos, em nome da universidade, para que seus financiadores conseguissem com que instrumentos inventados por Henry Cowell (como o rhythmicon, por exemplo) e por Léon Theremin também chegassem em suas mãos. Foi nesta fase que ele funda seu ensemble The Cage Percussion Players, com o qual adentrou os anos de 1940 compondo suas principais obras para percussão, além de disseminar a percussão erudita experimental em várias outras universidades no entorno de Seattle. Algumas das peças para percussão de John Cage desta fase – entre outras compostas nas décadas seguintes – estão nos álbuns Works For Percussion (WERGO, 1991) e Credo In Us / ...More Works For Percussion (WERGO, 2001), ambos lançado pelo ensemble francês Quatuor Hêlios. Interessante notar, aliás, que muitas biografias de Cage desta época salienta que a percussão ainda era tão marginal no meio acadêmico-catedrático-erudito – principalmente nos moldes teóricos e experimentais com os quais ele propunha revolucionar a arte da música –, que seus primeiros "músicos" e parceiros nem eram percussionistas formados de fato, eram apenas dançarinos, encadernadores e entusiastas da artes modernas. Exacerbando ainda mais seu experimentalismo conceitual, Cage ainda acrescentaria em sua coleção de kits de percussão outros apetrechos e kits do cotidiano tais como objetos industriais de metal e peças velhas de veículos e máquinas tais como bobinas, molas, tambores de freios, entre outras inúmeras tralhas. Além da intenção de trazer novos timbres – trazendo para a música uma paráfrase que flutuava entre a arte dadaísta e o cotidiano moderno das grandes cidades –, Cage também foi fanático por conceitos experimentais pelos quais tentava trabalhar a relação dos sons percussivos com o silêncio e modificar os timbres desses objetos em contato com a água, por exemplo.


Paralelamente à Varèse e a Cage, nós teremos, nas décadas seguintes, o interessante pioneirismo do compositor alemão Karlheinz Stockhausen e do compositor grego Iánnis Xenákis nos campos da percussão. Stockhausen é conhecido por suas explorações das métricas e dos contrapontos complexos, muitas das vezes inspirados por seus estudos nos estúdios de música eletroacústica. Xenákis, por sua vez, foi um compositor mais conhecido por uma elaboração intrincada um tanto baseada na geometria, na arquitetura e em complexas fórmulas matemáticas, além de também ser inspirado pela eletroacústica. As visionárias peças escritas por Stockhausen para percussão podem ser encontradas no box compilatório Complete Early Percussion Works (Mode, 2014) que traz peças como Schlagtrio (uma das primeiras peças do gênero que o compositor escreveu para piano e percussão), Zyklus (composição para percussão solo de 1957, com desenvolvimentos inovadores em termos de tratamento de tempo e estrutura), Kontakte (uma obra-prima para piano e percussão com fita magnética de 4 canais, que desafia os intérpretes a tocarem juntos e a fazerem o máximo de "contatos" com a fita), Mikrophonie (peça para seis percussionistas tocando um único instrumento, um tam-tam gigante de 60", sendo um desses músicos um tipo de designer de som que manipula em tempo real as configurações de volume, intensidade, tessitura e difusão espacial dos sons), Refrain (escrita para percussão e voz, com três intérpretes produzindo uma variedades de sons percussivos em combinações com sons vocais silábicos, gritos e estalos de língua), dentre outras. Já Xenákis, além de diversas obras onde a percussão assume um importante papel solista ou de coadjuvante junto a orquestras ou grupos de câmera, compôs ao menos três grandes peças com foco em percussão pura: Persephassa, para 6 percussionistas (1969), Pléïades, para 6 percussionistas (1978) e Okho, para 3 djembes (1989). Em 1986, o ensemble francês Les Percussions de Strasbourg gravou, na presença do próprio compositor, a integral da peça Pléïades numa performance de 44 minutos, gravação que ficou obscura até ser editada e lançada pelo selo Harmonia Mundi, em 1996. Paralelamente a este registro, o ouvinte interessado pode se recorrer a álbuns compilatórios como Xenakis: Percussion Works (Mode, 2006) onde temos a integral das gravações dos trabalhos para percussão de Xenákis em três CDs – incluindo a gravação histórica realizada pelo Les Percussions de Strasbourg, entre outras gravações de peças já do final da sua vida. 
Ademais também deixo aqui indicado o álbum Percussion Music: Works by Varese, Colgrass, Saperstein, Cowell, Wuorinen (Nonesuch, 2006) gravado pelo New Jersey Percussion Ensemble, com peças pequenas e médias dos compositores mencionados no título do álbum, com destaque para a integral das partes que constituem a fantástica Percussion Symphony (1976) do compositor americano Charles Wuorinen


No jazz, dois precursores dos estudos e álbuns solo de bateria e percussão pura são Art Blakey e Max Roach -- Blakey fazendo um elo entre o bebop e a percussão afro-cubana e africana, de forma mais latente e acentuada; Roach fazendo um elo entre o bebop e a percussão erudita, de forma mais implícita e improvisativa. No que diz respeito a se aprofundar nos desenvolvimentos e nos contextos da bateria e da percussão essencialmente jazzística, deixaremos para abordar estas facetas destes dois gigantes do jazz com mais foco e mais detalhamentos em outro post. Mas um álbum que aqui vem a calhar é Max Roach with the Boston Percussion Ensemble: registro captado ao vivo em 17 de agosto de 1958 em Lenox, Massachusetts. De 1957 à 1960, o edifício Music Inn, situado na vila de Lenox, em Massachusetts, abrigou – junto com programas de educação erudita, ligado à Boston Symphony Orchestra -- um pioneiro programa educacional chamado Lenox School of Jazz, um dos programas americanos pioneiros no que diz respeito à inclusão do jazz em grades universitárias, catedráticas e eruditas. Tendo o pianista John Lewis (do Modern Jazz Quartet)  como diretor artístico, a Lenox School of Jazz se tornou internacionalmente reconhecida e chegou a aceitar um total de 155 alunos de 20 estados americanos e de outros países como África, Brasil e Índia, promovendo estudos e intercâmbios de jazz com música erudita, entre outros gêneros, e tendo como professores ilustres mestres tais como Ray Brown, Herb Ellis, Dizzy Gillespie, Oscar Peterson, Bob Brookmeyer, Connie Kay, Percy Heath, Jimmy Giuffre, JJ Johnson, Marshall Stearns, Gunther Schuller e...Max Roach, aqui abordado. E um dos poucos registros que documentam esses intercâmbios é justamente este álbum, que documenta o encontro de Max Roach com Harold Farberman, jovem percussionista da Boston Symphony Orchestra – na época já aspirante à regente, ofício pelo qual viria a conduzir dezenas de grandes orquestras nas décadas vindouras. Max Roach também havia se graduado em percussão erudita na Manhattan School of Music anos antes, de 1950 à 1953, e o intercâmbio com Harold Farberman, graduandos e músicos da Boston Symphony Orchestra foi produtivo o suficiente para gestar esta apresentação ao vivo, captada e editada pelo selo EmArcy. Com composições, direção e condução de Harold Farberman, aqui temos a bateria marcante de Max Roach contracenando com os percussionistas da Boston Percussion Ensemble numa interação inédita de bateria de jazz com um expansivo conjunto de kits de percussão nos moldes da música erudita moderna – um registro bem à frente do seu tempo.

 

Em 1970, Max Roach, levando ainda mais adiante seu propósito de colocar sua música para bateria a percussão em evidência, fundou um octeto chamado M'Boom. Os membros originais eram Max Roach, Roy Brooks, Warren Smith, Joe Chambers, Omar Clay, Ray Mantilla e Freddie Waits, mas ao longo dos anos outros bateristas e percussionistas foram convidados. Todos os membros do M'Boom eram percussionistas, e usavam uma variedade de instrumentos além da bateria: tablas, cabaças, sinos, gongos, congas, marimba, tímpanos, vibrafone, xilofone, entre outros instrumentos. A filosofia de Max Roach para este grupo foi desenvolvida, na verdade, ao longo da sua carreira: era o conceito de que a bateria e os itens de percussão como um todo deveriam ser encarados não apenas como rítmicos, mas também como melódicos. Neste sentido, apesar do M’Boom ser formado essencialmente por jazzistas, o grupo passou a desenvolver uma amálgama muito criativa no sentido de mostrar influências não apenas da bateria e percussão jazzísticas, mas também da percussão afro-cubana, da world music e da percussão erudita moderna – trazendo ecos lá de detrás, de quando Roach teve seus primeiros intercâmbios com com Harold Farberman e o Boston Percussion Ensemble. Em duas décadas atividade, de 1970 até 1992, o grupo lançou cinco álbuns imperdíveis: Re: Percussion (Strata-East, 1973), M'Boom ( Columbia, 1979), Collage (Soul Note, 1984), To the Max! (Enja, 1991) e Live at S.O.B.'s New York (Blue Moon, 1992).


Outro dos músicos de jazz que é um dos maiores estudiosos da percussão, é o frejazzer e improvisador Milford Graves, figura importante em várias fases do avant-garde jazz. Proficiente pesquisador, acupunturista, escultor e atuante em seguimentos vários, como a jardinagem, a fitoterapia e as artes marciais, Milford Graves trouxe para sua particular sonoridade muitos elementos destas suas "atividades extra-curriculares" e das suas pesquisas realizadas fora do universo do jazz, propriamente dito, incluindo entre elas as percussões indianas, africanas e orientais (principalmente a japonesa) , além da faceta de alterar completamente a forma de tocar bateria baseando-se em suas observações e suas buscas sensoriais por timbres e sons que ele extrai da botânica e das suas pesquisas etnomusicológicas. A partir desses interesses incomuns, o baterista-percussionista do free jazz passou a desprezar as convencionais batidas de caixa e efeitos de pratos oriundos do bebop, e passou a ampliar seu leque de rítmicas e sonoridades: com sua sina em dar uma tratativa inusual para a bateria, ele passou  abordar o chimbal como se fosse um gongo, e dar tratativas diferentes para os outros kits da bateria, removendo as partes inferiores das caixas e substituindo-os por bongôs e outros kits de percussão, usando baquetas acopladas nos pedais no lugar dos convencionais batedores para atacar o bumbo, usando galhos e folhas de plantas e outros materiais orgânicos para mudar as sonoridades percussivas, entre diversas outras modificações e abordagens. Uma gravação pioneira de Milford Graves é o registro Percussion Ensemble, sua primeira e única gravação para ESP-Disk, captada em 1965, tendo como colaborador o percussionista Sonny Morgan. Milford Graves revela, inclusive, que os títulos das faixas receberam números de acordo com a quantidade de batidas em cada compasso. 


Milford Graves ainda tem outros álbuns em parcerias que o ouvinte interessado em percussão poderá apreciar: Dialogue of the Drums (IPS, 1974), por exemplo, traz conversações suas com seu grande amigo e baterista Andrew Cyrille, numa estética mais freejazzística; enquanto em álbuns do início da carreira tais como Arriba! (Prestige, 1964) e Wild & Warm (Prestige, 1965) o trazem ao lado do baterista e percussionista Montego Joe, numa abordagem de jazz mais afro-latino. Mas um dos registros mais impactantes que aqui quero frisar – além deste seminal Percussion Ensemble  –, é o documentado no álbum Pieces Of Time (Soul Note, 1983), que traz Milford Graves ao lado de três grandes bateristas e percussionistas da história do jazz: Kenny Clarke, um dos fundadores do bebop; Andrew Cyrille, um dos artífices do free jazz nos moldes das abordagens incendiárias de Cecil Taylor; e Don Moye, o versátil baterista e percussionista do Art Ensemble of Chicago, que externou as diretrizes da “creative black music” proposta pela AACM. Pieces Of Time é uma reunião fantástica de mestres da bateria jazzística e da percussão de vanguarda que traz uma versão amalgamada e expandida das misturas dessas diretrizes.
 
Em termos do jazz contemporâneo, um dos trabalhos mais interessantes com foco em ampliar as possibilidades percussivas da bateria é o de Dan Weiss. Trata-se de um dos maiores estudiosos das rítmicas contemporâneas do jazz, da música erudita moderna, da percussão africana e, principalmente, das possibilidades percussivas da música indiana. Em álbuns com Tintal Drumset Solo (Pi Recordings, 2004) e Jhaptal Drumset Solo (Pi Recordings, 2010), Dan Weiss pesquisa dezenas de estruturas e frases presentes nas polirítmicas métricas das tablas indianas – sendo Tintal Drumset Solo dedicado ao sistema de métricas da música carnática do sul da India, e  Jhaptal Drumset Solo dedicado ao sistemas de métricas da música hindustâni, do norte –,  e as traduz para os fraseios da bateria jazzística, tendo o acompanhamento do guitarrista Miles Okazaki, que tenta reproduzir as atmosferas melódicas contínuas das talas (sul) e das ragas (norte) como um plano de fundo meditativo. O interessante destes álbuns, aliás, é que primeiramente o baterista vocaliza as acentuações rítmicas por meio do fraseio vocal silábico e onomatopeico – numa espécie de scatting vocal indiano, com a finalidade de mostrar o fraseio característico presente nas estrutura rítmicas das métricas carnáticas e hindustânis  –, e em seguida transfere essas estruturas para seu drum set, com a bateria imitando exatamente a mesma exposição evidenciada pelo fraseio vocal. Já no álbum Sixteen: Drummers Suite (Pi Recordings, 2019) – álbum que aqui abordo mais a título de uma indicação indireta –, o baterista compõe uma suíte jazzística contemporânea – com vocais, eletrônicos e sopros (saxofones, trombone, tuba e etc) – baseada nos principais bateristas do bebop e free jazz: Max Roach, Elvin Jones, Tonny Williams, Philly Joe Jones, Kenny Clarke e Ed Blackwell. Cada faixa da suíte é dedicada a um destes grandes bateristas do jazz moderno, e em cada uma delas Dan Weiss exprime sua visão particular em relação as caricaturas rítmicas desses grandes mestres de forma contemporânea e pra lá de idiossincrática. 


Em termos de música erudita contemporânea, bem como da new music mais eclética e pósmoderna, um dos grandes ensembles a apresentar novas abordagens e contribuir para novas possibilidades no campo da percussão é o quarteto americano Sō Percussion. Proficientes na aplicação tanto de convencionais como de inusuais e exóticos instrumentos de percussão – incluindo  glockenspiel, tubos de alumínio, marimbas de vidro ou madeira, sinos e cactos amplificados, dentre tantos outros –, o Sō Percussion exerce a importantíssima função de interpretar peças pioneiras, e principalmente de encomendar e fomentar novas criações no campo da percussão contemporânea, executando obras já célebres ou estreando novas peças de compositores tais como Steve Reich, David Lang, Caroline Shaw, Bryce Dessner, Julia Wolfe, Vijay Iyer, Fred Frith, Dan Trueman, Tristan Perich, Paul Lansky, Steven Mackey, dentre muitos outros. Interessante notar, aliás, que algumas das novas peças encomendadas pelo Sō Percussion – dentre elas peças escritas pelos próprios membros do quarteto – valorizam a curiosa interação de percussão com a nova eletrônica contemporânea, com peças que colocam os efeitos de kits de percussão com sintetizadores digitais e programas de laptop, bem como com interações pósmodernas de percussão erudita com adereços criativos ecléticos advindos de formas, estéticas e estilos musicais variados, com influências que podem ir do avant-jazz ao indie rock, passando pela música eletrônica, música minimalista e... indo além. O álbum Amid the Noise (Cantaloup, 2006), com peças escritas por Jason Treuting, compositor principal do quarteto, é um exemplo singelo de como as influências flutuam entre os ecos das músicas de Brian Eno, Aphex Twin, Steve Reich, melodismos do pop-rock-indie e etc. A música minimalista de Steve Reich é, aliás, uma fonte inovadora de trabalhos para percussão que influencia o quarteto: o compositor americano escreveu emblemáticas peças para marimba e outros instrumentos de percussão com o intuito declarado de desafiar seus intérpretes nos quesitos da sincronia, da arritmia e dos efeitos timbrísticos que só suas camadas repetitivas foram capazes de produzir. Aqui neste post, além de Amid the Noise, quero indicar ao menos três álbuns do Sō Percussion: o registro Drumming (Cantaloupe Music, 2005), que traz uma interpretação fantástica das cinco partes da pioneira peça minimalista de menos nome, composta por Steve Reich entre os anos de 1970 e 1971; TERMINALS (Cantaloupe Music, 2014), constituído de cinco concertos compostos pelo baterista de avant-jazz Bobby Previte para conjunto de percussão e solistas – com a harpista Zeena Parkins, o saxofonista Greg Osby, o guitarrista Nels Cline, o tecladista John Medeski e o próprio Previte na bateria como solistas --, sendo cada uma das peças inspiradas nos mapas de terminais que Previte observou em aeroportos ao redor do mundo;  e o interessantíssimo Drumkit Quartets (Cantaloupe Music, 2016), com peças para percussão, colagens de áudio e eletrônica compostas pelo compositor – mais conhecido por ser baterista da banda de rock Wilco – Glenn Kotche, peças as quais trazem a colaboração da improvisadora e performer Yuka Honda, além de fazer alusões contemporâneas  ao manifesto A Arte do Ruído de Luigi Russolo e às peças de John Cage e Luc Ferrari. Não é tão recente, aliás, que Glenn Kotche tenha se mostrado um dos compositores contemporâneos mais proficientes em termos de obras para percussão. Em 2006, o compositor já lançara o interessante álbum Mobile (Nonesuch), com a peça de mesmo nome escrita pra múltiplos instrumentos de percussão: o álbum é uma inflexão contemporânea do minimalismo do final do século 20 – com citações diretas à Steve Reich, inclusive –, onde o compositor enxerta melodismos e adereços próprios e a música de gamelão para temperar a amálgama. Já o álbum Adventureland (Cantaloup Music, 2014) traz peças escritas para percussão, eletrônica e cordas em parceria com o célebre Kronos Quartet, e peças escritas para gamelão em parceria com o grupo Gamelan Galak Tika, além do próprio Kotche atuar sozinho em algumas faixas – interessante, aliás, são os enxertos de eletrônica nestas faixas interpretadas pelo Kronos Quartet, algo que dá um aspecto um tanto pósmoderno no sentido de unir o tradicional e o contemporâneo em uma só estética inovadora. Aqui já estamos falando de obras de percussão que perfazem o retrato da new music do século 21.





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